29 novembro 2010

“Mathilde", de Anaïs Nin


De dos, de Hans Bellmer


Por Laisa Teixeira e Rafaela Silva

No conto “Mathilde”, de Anaïs Nin (2005), há um percurso gradual para se chegar ao primeiríssimo plano, isso constrói o caráter erótico do conto, pois há um detalhamento, um lirismo, uma preocupação estética no discurso erótico, há poesia na narração, além de não haver a pura descrição clínica do ato sexual em si mesmo. Consta-se que o objetivo de Anaïs Nin não é simplesmente excitar o leitor, como se propõe a literatura pornográfica, até mesmo porque ao final do texto há o relato de uma cena nada convencional, pois “Antônio estava observando a ponta do canivete tocar a entrada do sexo de Mathilde” (p. 36).

Apesar do lirismo e das metáforas utilizadas no conto, ele também expõe de forma mais direta, em alguns momentos, a relação sexual, o que conotaria um aspecto mais pornográfico do conto, como visto neste fragmento: “Agachou-se por cima dela como um gato gigante e o pênis entrou nela. (...) Ele ergueu a bunda dela com as duas mãos e arremeteu contra ela sem parar” (p. 33). Entretanto, verifica-se que a tentativa de classificação do conto em erótico e/ou pornográfico não é tão importante, pois há uma linha tênue entre esses dois níveis. É necessário fazer uma análise de temáticas referentes à sexualidade expostas no conto, para isso, toma-se como referencial o texto O erotismo, de Bataille (2004).

O consumo de ópio possui um lugar relevante nas práticas sexuais de Mathilde, visto que na descrição das relações sexuais há a presença do ópio, sendo que este provocava uma intensificação das sensações, proporcionava a formação de fantasias, alucinações e uma dissolução do corpo na busca do prazer. Dessa forma, a dissolução do corpo e a criação de fantasias eróticas durante o ato sexual, impulsionadas pelo consumo de ópio podem ser associadas à leitura que Bataille faz sobre a sexualidade.

Segundo Bataille (2004), há um abismo e uma descontinuidade entre um ser e outro, fato consumado na relação sexual. No texto “Mathilde”, verifica-se esta concepção de descontinuidade dos corpos sobre o ato sexual, o que fica explícito neste fragmento do texto: “As pernas se abriam de maneira inumana, impossível, como se estivesse separadas do corpo, para deixar o sexo exposto, aberto, como se alguém pegasse uma tulipa com a mão e abrisse completamente à força” (p. 28).

De acordo com Bataille (2004), o dispositivo de passagem do estado normal ao desejo erótico pressupõe uma dissolução relativa do indivíduo, que por sua vez é um ser descontínuo. Nesse movimento de dissolução dos seres, o homem possui um papel ativo e a mulher assume uma posição passiva, visto que a parte feminina é desagregada, entretanto, ao final, tanto a mulher como o homem se misturam chegando juntos à dissolução. 

Em uma das passagens do texto “Mathilde” essa dissolução dos corpos no ato sexual é demonstrada, visto que cada movimento de Martinez no ato sexual servia para abrir completamente o corpo de Mathilde, até que este se despedaçasse completamente.

Bataille (2004), em sua filosofia, demonstra que o campo do erotismo é o da violência e violação, constata-se isso também no conto, pois as várias relações sexuais estavam envoltas dessas características, isso fica evidente quando Antônio penetra Mathilde de forma violenta, fazendo com que ela caísse no chão, além disso, no final do conto o mesmo tenta retalhar a genitália de Mathilde com um canivete.

Dessa forma, o conto traz à tona diversas questões relacionadas à sexualidade humana, que ora são tratadas de forma mais lírica e em outros momentos de forma mais explícita. Conclui-se que o erotismo é marcado pelo campo da violência e violação, além de ser acompanhado pela dissolução, descontinuidade e continuidade.

Referências:
BATAILLE, Georges. O erotismo. São Paulo: Arx, 2004.
NIN, Anaïs. Delta de Vênus: histórias eróticas. Porto Alegre: L&PM, 2005.

Um comentário:

Anônimo disse...

Muito bem escrito o texto, relacionou bem a teoria estuda de BAtaille com o conto da Anaïs Nin.
Parabéns as autoras


Júlia Graciele da Silva Borges