27 novembro 2010

Antes da ponte Rio-Niterói, de Clarice Lispector



Por Clayre Cristina Cardoso

Este é um conto um pouco confuso, narrado em primeira pessoa, constituído por várias histórias picantes, com um tom de fofoca que caracteriza a narrativa, e que faz uso de estruturas do cúmulo e da ironia do destino. É um conto considerado kitsch. Herman Brocha (1973) afirma “que o kitsch resulta de uma perversão do sistema da arte realizada por meio de uma racionalidade técnica voltada para o lucro comercial e/ou para a propaganda de sistemas de valor alheios ao campo específico dos valores da arte. No kitsch, haveria uma substituição da categoria ética pela categoria estética degredada em efeitismo”.

Neste conto, Clarice Lispector interage com o livro A hora da estrela, fazendo construção com o dialogismo.  A narradora, usa um tom despojado, da oralidade de quem conta causos e fofocas, frustando o leitor com a idéia de uma realidade traumática,vivida pela suas personagens.

Clarice Lispector descreve em seu conto situações inusitadas e grotescas, trazendo, conflitos amorosos, como traição, no caso do pai que era amante da mulher do médico.
Pois é.  Cujo pai era amante, com seu alfinete de gravata, amante da mulher do médico que tratava da filha, quer dizer, da filha do amante e todos sabiam, e a mulher do médico pendurava uma tolha branca na janela significando que o amante podia entrar. Ou era toalha de cor e ele não entrava (Lispector, 1998. p. 57).
Há também, a vingança e a violência; por ciúmes, a mulher jogou água quente no ouvido de Bastos.  Segundo Bataille (1980, p. 91-92) a violência de um propõe-se a violência do outro. De ambos os lados trata-se de um movimento que obriga a sair para fora de si, para fora da descontinuidade individual.
Bem. A mulher teve ciumes e enquanto Bastos dormia despejou água fervendo do bico a chaleira dentro do ouvido... (Lispector, 1998, p.58).
Para Angelica Soares (1999, p. 27), “sabemos que embora o erotismo seja um dos aspectos da vida interior do ser humano, este busca fora de si um objeto de desejo”.

Podemos perceber então que apesar do erotismo ser uma busca interior do ser humano, o homem não deixa de buscar o físico exterior do outro, pois como cita o conto, por ironia do destino, Bastos que havia terminado seu noivado, porque a noiva havia amputado a perna e ele que não perdoava defeito físico, acabou ficando surdo. Este é um conto que faz uso de uma série de clichês, que são consubstancias às personagens – todas estereótipos.

Clarice Lispector cria um efeito de confusão com as histórias por ela contadas que acaba atraindo o leitor, que acaba o conto dizendo que nao soube de mais notícias, reforçando a idéia de fofoca.

Referências:
SOARES, Angelica. A paixão emancipatória: vozes femininas da liberação do erotismo na poesia brasileira. Rio de Janeiro: DIFEL, 1999.
ALEXANDRIAN. História da literatura erótica. Rio de Janeiro: Rocco, 1993.
LISPECTOR, Clarice. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Melhor do que arder



Por Eliane Canedo

Este conto conta a história de madre Clara que vivia no convento, por exigência da família, e com o passar do tempo ela foi se descobrindo e viu que não era aquilo que ela queria.

Sonhava com homens e queria mesmo era casar, isso foi mesmo o que aconteceu porque ela tanto fez  que foi embora do convento. E logo conheceu um homem e se casou e teve vários filhos...

O conto nos faz voltar a um tempo em que moças de família eram obrigadas a viver no convento por imposição dos pais, assim escondendo os desejos das moças... Isso podemos relacionar ao que se chamaria hipótese repressiva sobre a qual podem ser levantadas três duvidas. Primeira dúvida:  a repressão do sexo seria, mesmo, uma evidência histórica? O que se revela numa primeira abordagem e que autoriza, por conseguinte, a colocar uma hipótese inicial... Um regime de repressão ao sexo.  

Clara foi levada a um mundo de devoção a Deus, no qual ela fielmente tentou manter-se, mas com o tempo o desejo foi aumentando e ela, não aguentando aquele desejo de sexo, de conhecer um homem, foi levada a abandonar a vida religiosa que nada tinha em comum com ela, era mesmo por causa da família que ela se deixou levar ao convento.

A repressão acontece desde a época das sociedades burguesas do XVII, sempre, às vezes somos obrigados a fazer coisas que não queremos, só para o bem estar de alguns (na maioria família). E até hoje se vê isso, pois nós mulheres somos criadas ou para ser dona de casa e esposa perfeita ou ir para o convento e seguir uma vida religiosa. Ainda bem que a repressão está diminuindo, a mulher de hoje está totalmente independente profissionalmente e aumentando sua autoestima e seu potencial.

Referências:
LISPECTOR, Clarice. Melhor do que arder. In: ______. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998. 
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.

A língua do P

Por Lana Alves

O conto “A língua do “P” pertence ao livro A Via Crucis do Corpo (1974), de Clarice Lispector. Escritora nascida na Ucrânia e que ainda pequena veio para o Brasil com os pais. Em 1943, terminou a Faculdade de Direito e escreveu Perto do Coração Selvagem, seu primeiro romance.

O conto “A lingua do “P”, narra uma experiência incômoda da personagem Cidinha, que faria uma viagem de trem de Minas para o Rio de onde embarcaria para Londres, no entanto, no decorrer da viagem entram no trem dois homens que começam a encará-la e a dizer algo, que ela percebeu que se tratava dela, em uma língua um tanto estranha de início, e que mais tarde ela percebera se tratar da língua do “P”, língua que tentava encobrir o desejo deles por Cidinha. Falavam nessa língua para que ela não compreendesse do que se tratava, ou melhor, para que a vontade deles prevalecesse pois eles, sendo homens, ocupam um lugar privilegiado no âmbito da expressão da sexualidade. Fica bem caricaturizada a forma como as figuras de poder usam do discurso sobre o sexo para seu benefício, isso também acontece em outras esferas, como no que se diz de repressão, que se desdobra na apropriação por parte de quem se diz habilitado a tratar, dominar e passar sua versão sobre algo que considera danoso, que pode desestabilizar a ordem vigente.

Em “Nós, os vitorianos”, Foucault (1988) afirma que “os discursos sobre o sexo não se multiplicam fora do poder, ou contra ele, porém lá onde ele se exercia e como meio para seu exercício”. Quem fala dele dita suas regras, e foi o que aconteceu quando Cidinha agiu como se fosse uma prostituta com o intuito de afastar os homens, ao que eles entenderam como loucura, pois ela não mais estava na posição da mulher erotizada que faziam dela, ela não estava no padrão que planejaram, e como é histórico em se tratando de loucura, Cidinha é levada á prisão.

Na prisão, não tem palavras para explicar o que ocorrera, pois sua conduta, e o lugar de onde fala, de receptora apenas dos desígnios de quem pode tratar do assunto, não a gabaritam para falar sobre sua expressão, mesmo sendo uma expressão de protesto.

A “língua” que transmitiu a mensagem que tanto a aterrorizara, não tinha explicação racional. Essa língua também é a mesma que invade e ao mesmo tempo seduz algo “puro”, inocente, é uma necessidade imposta, um grito a um ser que jazia surdo, essa língua pode ser comparada, em certo nível, às exigência com as quais, em algum ponto, nos deparamos, um “despertar” sexual. Cidinha, sem ter como se explicar, é presa e insultada por três dias, juntamente com seu cigarro que compunha bem uma característica comum de conduta da personagem que outrora adotara.

Quando Cidinha começa a se revelar ao se descobrir, quando se insinua, entra no campo do que foi descrito no domínio da sexualidade como noção de mistério, ao qual Cidinha desafia ao se revelar, assumindo um lugar na noção de obscenidade (Paes, 1990).

Quando saiu, foi de volta ao Rio, de cara lavada, sem a maquiagem da libertina que acabara sendo por algum tempo. Mas se lembrava de que quando os homens falaram em currá-la, ela desejava ser currada, aí se demonstra que ela também tem “desejos”, algo aconteceu com os sentidos de Cidinha naquela ocasião de “perigo”, descobrira-se uma devassa.

Já no Rio, andando pelas ruas de Copacabana com suas novas constatações em mente, passou por uma banca de jornal e comprou um, e lia-se que uma moça foi currada e morta no trem, a mesma moça que a desprezou. E nisso se coloca o paradoxo, a “perversidade” que a moça nega lhe traz a morte e quanto a Cidinha que a aceita, vive com a impressão de que já se sabia assim; a moça, ao negar assumir conduta semelhante a de Cidinha e antes até, de negar a aparência dela, morre, visto que na verdade ela também devia possuir em si os mesmos elementos que Cidinha, mas os nega, pois ainda tem arraigados os parâmetros sociais da mulher que nunca deve ser vulgar.

Por outro ângulo, essa moça que ficava na estação e entrava no trem para ser violentada pode ser vista como a própria imagem de Cidinha, que despreza algo que lhe é comum, a sexualidade, resistência essa que é violentada e morta quando tem que representar a prostituta, que apesar de exagerado, é aí o símbolo de expressão da sexualidade. Cidinha conclui, aos prantos, que o destino é implacável; nisso podemos enquadrar não somente o destino da moça, mas o destino dela própria, que perdeu ali uma parte de si, quando adotou uma postura sensual, acaba “matando” uma parte pudica, e se descobre um tanto perversa por saber fazer trejeitos e usar sua feminilidade para despertar a atenção do sexo oposto, mesmo que nesse caso, não visando a sedução, e sim a repulsa por parte deles.

É notável nesse conto a importância da perversidade dos homens diante de seu objeto erótico, as moças “recatadas”, pois se esse objeto se mostra demais, salta a seus olhos e lhes convida, torna-se desinteressante. Aí se impõe a imagem erótica em lugar da pornográfica em face da perversidade, visto que, para ambos, Cidinha era uma imagem erotizada, incitava o desejo criado pelo interdito que, para Bataille (2004), é a essência do erotismo. Ela não traz em si elementos pornográficos, pois não é aquilo que de imediato lhes causa excitação se mostrando, pode assim ser, quando finge ser prostituta, a visão mais erotizada e não de nível pornográfico e é causa de impulsos perversos nos homens.

Referencias:
BATAILLE, Georges. O Erotismo. São Paulo: Arx, 2004.
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.
LISPECTOR, Clarice. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco: 1998.



Por Erli Porto

... depois... eu ainda não beijarei sua boca, não agora. Eu irei passear com a ponta de minha língua pelos seus lábios... Lindos lábios como se quisesse sentir o gosto de seu corpo através de sua boca. E lamberei sua face, como fera lambendo sua presa... Doce presa. Você será meu, só nesse momento, um breve momento. Sua orelha... Suplico que seja meu por um instante apenas, não mais que isso. Sou fera nesse momento, não me importa mais o mundo lá fora. Só penso em saborear a minha presa, linda presa. Não tente escapar! Deixe-me sentir seu gosto... O seu cheiro... Quero o seu suor em meu corpo... Minhas mãos tornam-se atrevidas e começam a explorar você. Conhecerei seu peito, suas costas, você... Novamente seus cabelos. Minha boca morderá a sua, devagar... Minha língua procurará a sua... Meu corpo tocará o seu e, então, você sentirá o que é capaz de provocar em mim... Mordo meus lábios para prender o prazer... Que prazer... E... O beijo... Ah esse beijo! Resisto. Por enquanto... Quero prolongar a vontade... Até não resistir mais... Não posso mais... Não agüento mais a vontade do beijo... Minha boca encontrará a sua, lentamente... Quero o beijo... Quero sentir o que provoca em mim...  Quero sentir meu corpo junto ao seu... Toque-me... Deixe-me sentir suas mãos...  Dê-me seu beijo... Somente um beijo... Nada mais lhe peço... Mereço esse beijo... Esperei por ele... Sonhei com ele... Chorei por ele. O beijo louco, proibido, apaixonado, quente, sem culpas, irresponsável... Que me fará sentir mulher... Beije-me.

Hipótese repressiva para a sexualidade no conto “A língua do “P”



Por Marília Nunes Ribeiro

A repressão sexual, que era própria das sociedades chamadas burguesas, foi marcada principalmente no século XVII, chamado a “Idade da Repressão”. Nessa época, existia, principalmente sobre as mulheres, uma moral que reprimia a sexualidade, a sua prática era permitida dentro do casamento e na maioria das vezes era tolerada com sacrifícios pelas mesmas. Com a ascensão da burguesia, a repressão sexual faz funcionar a máquina do capitalismo, pois, para essa sociedade, mantendo o controle sobre o sexo, os interesses sobre as classes dominadas eram mantidos.

A sociedade burguesa faz algumas concessões sobre o sexo, como escreve Foucault (1988): “Se for mesmo preciso dar lugar às sexualidades ilegítimas, que vão incomodar noutro lugar: que incomodem lá onde possam ser reinscritas, senão nos circuitos da produção, pelo menos nos de lucro...” no caso seriam as casas de prostituição, por ecemplo, as zonas de tolerância onde tudo é permitido; fora desses ambientes, o assunto sexo se torna inexistente. 

No conto “A língua do “P” da autora Clarice Lispector, a personagem Cidinha passa por uma situação difícil e a única saída que encontra é se fingir de prostituta para se livrar dos bandidos. Depois de ter sido presa e solta pela polícia, Cidinha tinha uma preocupação: havia sentido vontade de ser estuprada pelos bandidos e diante desta descoberta a personagem disse: “Eu sou uma puta”, e isto a deixa arrasada, pois como já vimos anteriormente, esses pensamentos e desejos eram considerados como pecado e proibidos diante da sociedade e da igreja.

De acordo com Foucault (1988), “se o sexo é reprimido, isto é, fadado à proibição, à inexistência e ao mutismo, o simples fato de falar dele e de sua repressão possui como que um ar de transgressão deliberada”.

Referências:
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: A vontade de saber. Rio de Janeiro: Edição Graal, 1988.
LISPECTOR, Clarice. A língua do “P”. In:______. A via Crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

Melhor do que arder



Por Roberta Ferreira

O conto “Melhor do que arder”, de Clarice Lispector, narra a estória de uma madre, Madre Clara, que é obrigada pela família a ir para um convento, porém, sente desejos sexuais, e acaba por seguir os conselhos de um padre deixando o convento e procurando se casar, já que, segundo a Bíblia, é melhor casar do que arder.

Conforme afirma Foucault (1988, p. 9), até o início do século XVII, não existia tanta repressão com relação ao sexo, foi como passar dos tempos que o assunto virou tabu, algo indigno de ser comentado, e praticável apenas na intimidade dos quartos de casais: é essa repressão que se observa no conto.

No conto, a sexualidade é tratada de modo velado e sutil, em nenhum momento aparecem cenas ou termos que indiquem o ato sexual em si, nenhuma palavra obscena ou chula, ou sequer expressões de duplo sentido.

Apesar disso, o desejo sexual é o assunto principal do conto, repetidas vezes é retratada a necessidade que Madre Clara tem de se relacionar intimamente com um homem, dos desejos e de como ela tenta fugir deles: “Não podia mais ver o corpo quase nu do Cristo”; “Passou a dormir na laje fria”; “Foram passar a ardente lua de mel em Lisboa”.

A estória é permeada por um cunho religioso extremo, dentro do convento a madre é constantemente aconselhada a fugir de seus desejos e “mortificar a carne”, como se o sexo fosse um grande pecado, do qual se devesse fugir a qualquer custo. Mesmo sendo tão inerente à natureza humana, o desejo sexual é visto como se fosse algo de que se devesse envergonhar.

Pode-se notar, contudo, que a própria religião que obrigava a madre a fugir e se envergonhar de seus desejos, dá a ela a solução para suas frustrações, a relação sexual não é proibida quando ocorre sob a benção divina, isto é, entre um casal unido pelos sagrados laços do matrimonio. E é baseado nas palavras de Paulo no livro de Coríntios que o padre do convento aconselha a Madre Clara. “É melhor não casar. Mas é melhor casar do que arder” (lispector, 1998, p. 72).

Neste sentido, apesar de a madre admitir seus desejos e deixar o convento, ela não sai logo em busca de satisfação sexual, a religiosidade está tão clara neste conto que mesmo fora do convento ela manteve um vestuário simples, como o do convento, e o hábito de rezar, pedindo a Deus um homem; e mesmo ao encontrá-lo não cedeu logo aos desejos sexuais, primeiro casou-se.

No conto, não é retratado o ato sexual em si, mas apenas a necessidade que o ser humano tem de se relacionar sexualmente, e ainda que sexo seja o tema, ainda há muito pudor em retratá-lo.

Enfim, há um erotismo comedido no conto, as necessidades e desejos sexuais da personagem são retratados de maneira brilhante pela autora. A narrativa leva o leitor a pensar sobre o sexo, sem contudo ser baixa ou chula, já que erotismo e pornografia estão longe de ser a mesma coisa, já que a pornografia tende a retratar cenas e objetos obscenos e o erotismo apresenta expressões de sexo, sem contudo ser baixo ou chulo.

Sempre há de existir na literatura obras eróticas, que despertem a atenção do público leitor e toquem naquilo que ao longo dos tempos vem sendo tão reprimido, e ao mesmo tempo tão cobiçado, o sexo.

Referências:
FOUCAULT, Michel. História da sexualidade I: a vontade de saber. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988
LISPECTOR, Clarice. Melhor que arder. In: ______. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

O poder da imagem



Por Júlia Graciele da Silva

O conto de Clarice Lispector, “Ele me bebeu”, é uma história que na época em que foi escrita provavelmente deixou muitas pessoas inconformadas, ou melhor, as pessoas não gostariam de ouvir falar, pois, de certa maneira incomodava a sociedade em geral, vista que a homossexualidade sempre foi um grande tabu. 

No conto, a homossexualidade é tratada de uma maneira sutil, a autora faz insinuações a respeito de Affonso Carvalho e Serjoca. Enfim, a narrativa leva-nos a entender que ambos se gostaram.

Em se tratando da personagem de Aurélia Nascimento, a autora nos apresenta uma mulher fútil, a qual está sempre preocupada com a aparência e status, deixando-se levar pelo outro, porém ao perceber que o homem pelo qual está interessada é cortejado por “outro”, que é seu amigo e maquiador, esta se sente muito mal.

O mal-estar de Aurélia no conto talvez aconteça por não entender o que está acontecendo a sua volta, pois o homem a quem quer conquistar preferiu seu amigo. Ou talvez por ser naquele momento que realmente descobriu quem era, sem maquiagem e sozinha.

O fato é que Aurélia não aceita este relacionamento, e tenta achar respostas em si mesma, quando tudo acontece ela percebe que nunca existira, que o que viveu foi uma farsa, a partir daquele momento ela se reencontra consigo mesma.

O título do conto pode ser explicado sob a seguinte lógica: Aurélia entende que Serjoca, ao maquiá-la, quer apagar a mulher que realmente existe e infundir outra em seu lugar.

Para Bataille (2004), a paixão é um sentimento que nos leva ao sofrimento, sendo a busca incessante pelo impossível, a personagem Aurélia é a prova desta afirmação. Ao ter convicção que não conseguiria conquistar o ser amado ela sofre e tem uma dupla decepção, uma causada pelo ser amado e outra por seu amigo e maquiador.

Referências:
BATAILLE, Georges. O erotismo. São Paulo: Arx, 2004.
LISPECTOR, Clarice. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.