17 novembro 2010

A repressão e o desejo



Por Patrícia Mendes

No conto “Miss Algrave”, a protagonista Ruth Algrave é cheia de pudores. Ela é irlandesa e vive sozinha num apartamento em Londres, faz pose sendo moralista. Tudo para ela era considerado pecado, portanto, proibido, como por exemplo, comer carne ou tomar banho nua.

Ela se orgulhava de sua situação, solteira, virgem, pura e casta e se achava no direito de julgar os outros, principalmente as mulheres que viviam em situações diferentes dela, ela classificava tudo como imoral ou falta de vergonha, ela repudiava até a sexualidade dos pais.

A felicidade para ela era dedicar-se ao trabalho, visitar sua amiga idosa, tomar chá e alimentar os pombos, mas sua vida dá uma reviravolta ao receber a visita de um ser de outro planeta, o Ixtlan, e ao sentir o gozo pela primeira vez. Os seus conceitos mudam e ela passa a fazer tudo aquilo que ela condenava: de moça cheia de pudor ela se transforma em mulher viciada em sexo, primeiro ela sai à procura de homens apenas para satisfazer o seu desejo, mas depois ela descobre que pode fazer disso uma profissão e ganhar dinheiro, então sua vida começa a girar em torno dos prazeres.

Nesse conto podemos perceber a presença da repressão sexual e a associação do sexo, do prazer com o pecado. A protagonista é uma mulher que vive reprimindo e negando sua sexualidade, que se sente culpada pela lembrança que a atormenta: “[...] quando era pequena, com uns sete anos de idade, brincava de marido e mulher com seu primo Jack [...]” (Lispector, 1998, p. 13). Ela manifesta um sentimento de repulsa em relação à sexualidade, portanto, se ela falasse sobre sexo, estaria transgredindo.

Segundo Foucault (1988) e o que ele chama de hipótese repressiva, ao retirar a sexualidade que transitava de uma maneira livre até o século XVII e colocá-la na esfera privada, a sexualidade foi reduzida à sua função reprodutora e restrita ao casamento, o que acarretou a submissão sexual (principalmente das mulheres) e tudo o que ocorresse fora desse contexto era condenado.

Referências:
FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade I: a vontade de saber, tradução de Maria Thereza da Costa Albuquerque e J. A.Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edições Graal, 1988.
LISPECTOR, Clarice. A via crucis do corpo. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

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